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Economia agroexportadora

Maria da Conceição Tavares (mesmo Caio Prado Jr).

Economia Agroexportadora

”Modelo primário-exportador”/“Modelo agroexportador”: forma de inserção da economia brasileira na economia mundial, que dá forma à dinâmica do Balanço de Pagamentos do Brasil.

(Há críticas de que há certo exagero nesse foco ao exterior da economia brasileira.)

Setor de subsistência no Brasil não tem tanta relevância na economia em si.

Maria da Conceição Tavares: Modelo de desenvolvimento voltado para fora. Não só o foco da produção, mas também está muito mais ao sabor dos fatores exógenos de fora.

Oscilações do preço do café

  • Demanda internacional (ciclos mundiais)
  • Oferta (geadas, pragas, etc)
  • Defasagem entre plantio e colheita (Delfim Netto): a oferta reage à demanda de anos (devido ao tempo de florescimento etc)! Mas há críticas: o plantador realmente pensa no preço de 4 anos após? (Copiei certo?)

Termos de troca e tendência declinante

Termos de troca: relação entre preços de exportações e importações de uma economia.

Segundo certos autores – e isso é controverso –, há uma tendência de deterioração dos termos de troca de uma economia agroexportadora frente a economias manufatureiras (ainda mais com economias industriais): os preços de exportação tendem a cair com relação aos preços de importação (afetando a balança de pagamentos).

Pode ser explicada, por exemplo, por:

  • Elasticidade-Renda da Demanda de produtos primários serem menor que (inelásticas) & elasticidade renda da demanda de produtos manufatureiros ser maior que : com aumento da renda, há uma demanda maior por manufaturas (que provavelmente agem como Bens Normais) e menor por produtos primários (que provavelmente agem como Bens Inferiores)
  • Mercado do tipo Oligopólio para produtos manufaturados, mas mercado concorrencial para produtos primários: aumentos de produtividade são refletidos totalmente no preço para primários (provavelmente para aumentar competitividade frente à alta concorrência), e refletidos parcialmente em lucro para manufaturas (não só para aumentar competitividade, pois a concorrência não é tão grande – é possível acumular margens)

Vulnerabilidade da economia brasileira – importações

O bulk do Consumo brasileiro vinha das Importações (Macroeconomia). Ou seja, há uma enorme diferença qualitativa entre a base produtiva e o consumo do modelo agroexportador. Isso naturalmente traz uma vulnerabilidade enorme à economia (jura?).

”Brasil dual”

Há “dois Brasis”:

  1. Exportador: moderno, dinâmico, produtivo
  2. De subsistência: atrasado, estagnado, baixa produtividade

A relação entre ambos depende das relações de produção, da interconexão entre ambos. No período colonial/pré-república, a economia de subsistência tinha algum fôlego a mais quando a economia exportadora possuía algum ímpeto maior, i.e. via efeito Multiplicador.

A economia brasileira de subsistência era peça acoplada à economia exportadora colonial

Consequências da introdução do trabalho assalariado

”A massa de salários é o núcleo de uma economia de mercado interno” (Celso Furtado)

O trabalho assalariado alavancou o mercado interno brasileiro

As principais consequências disso são de ampliar efeito multiplicador sobre a economia, através da ampliação da especialização das fazendas.

Isso é pois, no período escravista, muita pouca coisa do consumo dos trabalhadores (escravos) era comprada de fora: muito era feito pelos próprios escravos. Com a introdução do trabalho assalariado (e.g. imigrantes a princípio), há uma parte bem maior do consumo que ele passa a comprar de outrem, não mais 100% produzido dentro de sua propriedade – ou seja, há uma especialização envolvida, da parte de quem ele comprou! (E isso não tem nada a ver com melhores condições de vida, a princípio.)

Surge agora uma Vantagem Comparada em produção destinada ao consumo doméstico (não internacional) por parte de certos produtores (não 100% de sua produção, mas uma parte não desprezível agora).

Com isso tudo, naturalmente surgem novos hábitos de consumo, o que se torna um feedback loop positivo.

Demanda por moeda

Com isso tudo, há um aumento pela demanda por moeda, para transações, em meio a uma inflexibilidade do sistema financeiro nacional (e política imperial, “direcionada para fora” por natureza).

Não há Multiplicador Bancário at all, pela ausência de Banco Central e poucos bancos; no máximo alguns empréstimos somente.

Na época predominava a política do padrão-ouro: emitir moeda somente no tocante às reservas existentes.

Tendência ao desequilíbrio externo (Furtado)

Problemas de delay entre Exportações (Macroeconomia) e Importações (Macroeconomia): as decisões de exportações passam a se separar das decisões de importações, pois há uma nova demanda de Consumo, não mais desprezível, que é totalmente distinta dos produtores de outrora: pessoas comuns!

Ou seja, começam a aparecer casos em que a Taxa de Câmbio está em baixa (exportações diminuem), mas as importações levam mais tempo para cair, causando um desequilíbrio externo.

Com isso, surge uma discussão sobre como combater esse desequilíbrio: ver as regras do padrão-ouro, versus desvalorizar o câmbio.

  • Se for desvalorizar o câmbio, vai induzir Inflação (socialização das perdas, espalhadas sobre a economia toda – Furtado)
  • Se não for desvalorizar o câmbio, vai induzir Desemprego

Há casos em que não cabe desvalorizar o câmbio, pois estouraria as dívidas em dólar dos Investimentos (Macroeconomia) domésticos: depende da estrutura patrimonial do país.

Lógica Econômica na Primeira República (1889-1929)

Especialização induz um efeito multiplicador sobre a economia interna, assim como induz um aumento pela demanda por moeda (para transações). Muitas discussões surgem sobre como conduzir a Política Monetária.

O que é padrão-ouro?

Padrão-Ouro

Tais regras podem causar uma recessão profunda conforme hajam déficits no Balanço de Pagamentos:

Modelo Mundell-Fleming: Déficit no balanço de pagamentos induz uma queda nas reservas e, portanto, na oferta de moeda. Isso naturalmente induz um aumento das Taxas de Juros, e induz uma Recessão, induzindo uma queda nas Importações (Macroeconomia) etc, tentando induzir um equilíbrio do balanço de pagamentos.

Segundo padrão-ouro, um aumento da taxa de juros pode induzir entrada de capitais no país – mas quem vai querer investir no Brasil, um país agroexportador, em recessão!? Os riscos são maiores do que os retornos devido aos juros altos. Logo, Furtado argumenta que fluxos de capitais são pró-cíclicos: entram mais justamente quando a economia está de vento em popa.1

A alternativa é (segundo Furtado) de trabalhar com câmbio flexível:

Com um déficit do balanço de pagamentos, promulga-se uma desvalorização cambial, com que os preços de produtos importados aumentam com relação aos produtos nacionais: isso induz aumento de Exportações (Macroeconomia) (menores preços para o exterior) e diminuição de Importações (Macroeconomia) (maiores preços para o interior). Dessa forma, há o que Furtado chama de Socialização das Perdas: as perdas ocorrem na forma de aumentos de preços (Inflação), não de perdas de empregos.

A desvalorização cambial protetiva ocultava informações de mercado sobre excedente de oferta de café na República Velha: Delfim Netto: com a diminuição do preço externo do café, há alguma alteração na demanda internacional; ao haver desvalorização cambial, tal “sinal de mercado” não é transmitido ao produtor doméstico! Com isso, pode acabar surgindo superproduções de café (como, de fato, ocorreu).

Políticas econômicas da República

Proclamação da República advém da inadequação político-institucional às condições socioeconômicas do Brasil à época.

As consequências são uma descentralização administrativa (estados podem se endividar individualmente), e hegemonia da cafeicultura paulista: desvalorizar o câmbio em momentos de crise (queda do preço internacional do café) e estocagem do café (políticas de defesa).

Grupos de interesse

Boris Fausto: cafeicultura é hegemônica, mas não dominante; há outros grupos com poder de pressão

  • outras oligarquias (não-cafeicultoras)
  • Interesses internacionais
    • Bancos, investidores externos, capital
  • Grupos não-oligárquicos (classes urbanas etc)

Cafeicultura não é um grupo homogêneo (Saes, Perisinotto): distinção entre “lavoura” (produtores/exportadores) e grande capital cafeeiro, com interesses diversificados (por exemplo, capital ferroviário).

Portanto, o grande capital cafeeiro – para além do cafeicultor em si – tem interesses distintos e até conflitantes em tempos: desvalorizar o câmbio ou não toma em conta estes distintos interesses e a conjuntura de poder deles.

Política Econômica na Primeira República

Rui Barbosa & Encilhamento

Criticado pelos historiadores monetários (crise fiscal/cambial), mas defendido pelos historiadores da industrialização.

Papelistas vs Metalistas

Metalismo = estabilidade cambial, defesa do padrão-ouro: a moeda tem seu valor intrínseco dado por seu conteúdo metálico.
Desvalorização cambial = fruto de um excesso de emissões, geralmente associado a aumentos de Gastos Públicos (Macroeconomia).

Papelismo = necessidades de circulação. A moeda (papel-moeda) precisa dar fluidez aos negócios, uma necessidade do mercado.
Taxa de Juros alta = falta papel-moeda no mercado (vide faltas de Numerário no Rio de Janeiro logo ao final do Império)
Desvalorização cambial = é um problema de Balanço de Pagamentos

Política econômica imperial (metalista)

Restrição a ampliação de meios de pagamento2;
defícit público financiado com crescimento da dívida externa (empréstimos do exterior, para entrada de ouro/libras no país).

Objetivo é conversibilidade (valorização da taxa de câmbio): é atingida, mas há sérias crises de liquidez no mercado doméstico.

Rui Barbosa

Lei Bancária (1890)
Lei Bancária de 1890 (Janeiro): papelista, reverte a política da última década imperial3.

  1. Emissões inconversíveis (emitidas por 6 bancos oficiais)
  2. Emissões lastreadas em títulos públicos (não em ouro!)
    • E quem vai confiar nestes títulos a esse ponto!? Os bancos oficiais…
  3. Emissões regionalizadas

Encilhamento

Foi um processo de especulação na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, aumentos bem altos das ações. (Tenha-se em vista que houve uma facilitação da criação de Sociedades Autônomas com Rui Barbosa.)

Desvalorização cambial 1891

  1. Expansão monetária (Lei Bancária 1890) reflete no câmbio
  2. Rui Barbosa: fuga de capitais em função da crise na Argentina (default)
    • Defendida pelo Boris Fausto
  3. Gustavo Franco: fuga de capitais também pela visão externa da política de Rui Barbosa

Próximos governos republicanos

Tentativas de reverter descontrole de emissão monetária (pluralidades emissoras4) e contaminação do mercado com empresas fictícias.

Importações reagiram pouco com relação à desvalorização cambial devido ao Efeito Renda: mais pessoas tinham condições de demandar importações agora – ainda mais com avanço de crédito doméstico! (I.e. déficit primário.)

1894-1895: preços do café começam a cair, mas não há expansão de produção (?)

Funding Loan 1898: Campos Salles e gestão Murtinho

Funding Loan (1898)
Situação insustentável de dívidas – funding loan (em particular com os Rothschild).

Consolidação da dívida externa com novas condições:

  • Melhores condições no curto prazo, mas piores vistas a longo prazo
  • Desembolsos de juros a serem pagos em 3 anos, e o pagamento principal em 13 anos
  • Condicionalidades (como “hipotecas”): hipoteca da alfândega do RJ (impostos alfandegários etc), imposições de reversões da política econômica

Joaquim Murtinho: metalista e polêmico.

  • Equilíbrio fiscal/monetário
    • Políticas ortodoxas
    • Queimas de papel-moeda: Política Monetária Contracionista
    • Elevação de impostos:
      • Pressão externa pelos credores
      • Pressão interna contra desvalorização cambial e inflação
  • Recessões de indústria

Falta de liquidez e aumento de taxas de juros recessão e crise bancária de 1900, falência geral (até de cafeicultores). Problemas com valorização cambial e queda de preços afeta café.

Primeiro Plano de Valorização do Café e Caixa de Conversão

Há uma tendência à superprodução do café, pela abundância de terras e Exército Industrial de Reserva (Sobrepopulação Relativa) (salários constantes efetivamente, e baixos).

Na imagem fica bem claro, a partir de 1891 (Rui Barbosa em diante): há uma compensação dos preços do café através de desvalorização cambial5. Portanto, havia um “mascaramento” dessas mudanças no mercado internacional com relação à visão do produtor: ele continuava produzindo!

Note-se que o café é uma cultura perene: é uma cultura que leva tempo para começar a produzir, e continua produzindo por anos e anos. Ou seja, não é uma cultura que pode parar de ser produzida: é um investimento que tem um “efeito de arrasto” muito maior do que culturas temporárias.

1905: perspectiva de supersafra em meio a queda de preços – perigo à vista!

Primeiro Plano de Valorização do Café

1901: taxação sobre novas plantações

Convênio de Taubaté (1906)
1905/1906: Convênio de Taubaté & 1º Plano de Valorização do Café: fim do livre mercado de café.

  • Governo estoca parte da produção do mercado de forma a sustentar os preços, e recolocação da oferta posteriormente, em períodos de queda de oferta: sustenta o preço, diminui volatilidade e riscos da produção

Pressupostos:

  • Brasil tem poder de mercado sobre o café, então tinham algum controle sobre a oferta mundial do mercado (portanto, do preço)
  • Inelasticidade da demanda: aumentos de preço não podem diminuir a demanda de tal forma a diminuir a Função Receita do produtor (parece ser confirmado)
  • Desequilíbrios temporários, possibilidade de reversão posterior da oferta (não deixar estoques parados por muito tempo). É um problema a longo prazo, pois incentivou mais produção/plantio ainda sob os preços estáveis – incentivou até mesmo gente que não investia antes, devido ao risco prévio!

Os financiamentos da estocagem foram principalmente feitos por agentes externos, até chegando a estocar fisicamente fora do Brasil.

Caixa de Conversão

O 1º plano de valorização do café iria induzir uma valorização cambial (pois haveria entrada de moeda estrangeira pelas exportações e investimentos etc), por isso foi necessário atrelar este plano à caixa de conversão, para evitar essa valorização: mudança de regime cambial, para câmbio fixo com política monetária passiva (emissões lastreadas, com reservas internacionais), fixar padrão-ouro.

Tudo muito bem até 1912-1913, uma reversão do Balanço de Pagamentos: pagamento do principal da dívida externa (do Funding Loan), crise das exportações de borracha (25% de exportações a 0% em dois anos!!), e reversão de fluxo de capitais devido aos conflitos crescentes da Primeira Guerra Mundial.


References

Footnotes

  1. Pode-se argumentar que há diferenças grandes entre recessões passageiras (onde pode haver, sim, entrada de capitais) e recessões maiores (onde pode haver precaução de agentes externos). Não é conclusivo até hoje.

  2. I.e. Papel Moeda em Poder do Público.

  3. Há uma virada nos últimos meses do Império, com o ministro Ouro Preto.

  4. Algo bem de época, quase um “arroubo” republicano.

  5. Mais réis necessários para perfazer uma libra esterlina, por isso aumentando no gráfico.