up:: 063 MOC Economia Brasileira


Fonte: Amaury Gremaud.

”O processo de correção do desequilíbrio externo [por políticas cambiais] significava, em última instância, uma transferência de renda daqueles que pagavam as importações para aqueles que vendiam as exportações. Como as importações eram pagas pela coletividade em seu conjunto, os empresários exportadores estavam na realidade logrando socializar as perdas que os mecanismos econômicos tendiam a concentrar em seus lucros.” (FURTADO, p. 165)

A ideia de “socialização das perdas” de Furtado vem da diminuição das perdas ocasionadas por baixas de preços internacionais do café, através de políticas cambiais (em particular, Desvalorização Cambial).

O exemplo que Furtado dá é bem ilustrativo (p. 165):

InicialmenteApós choque externo
Preço por saca25 USD/sc15 USD/sc ()
Taxa de Câmbio
(as is)
8 BRL/USD8 BRL/USD
Taxa de Câmbio
(intervenção)
---12 BRL/USD (p. ex.)
(depreciação cambial)
Receita por saca
(as is)
200 BRL/sc120 BRL/sc ()
Receita por saca
(intervenção)
---180 BRL/sc ()

Ou seja, mediante um choque adverso internacional, que cause queda de preços do café, naturalmente afetaria a Receita dos produtores de café. Para evitar a quebra em massa dos produtores brasileiros, o governo perpetrava depreciação cambial – em geral contraindo empréstimos externos, causando entrada de divisas no país –, de tal forma que o lucro que os produtores “viam” estava “inflado”.

Naturalmente alguém estava pagando o preço, e era o resto da população: como a Taxa de Câmbio diminuiu, isso induz um aumento de Exportações (Macroeconomia) e contração de Importações (Macroeconomia). Como havia uma dependência muito grande (na República Velha) das importações para suprimento do Consumo doméstico, a depreciação cambial naturalmente trazia Inflação1.

Por que socializar as perdas?

A cultura de café requer muito capital, de maneira perene: mobilizados os recursos para o plantio, demoram-se cerca de anos para a colheita, a qual continuará dando frutos por mais de uma década.

Portanto, demandar a “diminuição da produção” em momentos de excesso de oferta não era uma opção ótima, posto que não só requeriria desfazer todos os investimentos envolvidos na cultura cafeeira, como efetivamente não haviam alternativas rentáveis de investimento dentro do país. Some-se a isso a rigidez dos salários reais dos assalariados envolvidos, e então percebe-se que os produtores cafeeiros estavam em um mato sem cachorro: não havia formas de compensarem suas perdas que inevitavelmente viriam, devido à superprodução que traziam ao mercado2.

Como eram uma parte totalmente não-desprezível da economia brasileira, a melhor decisão seria proteger os produtores de café, a fim de evitar piores consequências à economia como um todo.

Naturalmente, porém, os impactos que eram herdados pelo resto da população eram maiores do que para os produtores de café: sucederam-se vários momentos de instabilidade social, minando parte da hegemonia que a oligarquia cafeeira possuía logo do começo da República.


References

Footnotes

  1. Por questão de oferta baixa preços mais altos.

  2. A certo ponto, o Brasil possuía uma parcela enorme do mercado mundial de café, o que evidentemente requeria preços baixos o suficiente para que se mantivessem como semi-Monopólio (o que dificultava ainda mais a questão toda de rentabilidade).