up:: 010 MOC Marxism

”A relação quantitativa, segundo a qual os produtos são trocados, é totalmente contingente de início. Eles assumem a forma de mercadorias tão logo sejam passíveis de troca em geral, isto é, tão logo sejam expressões de um terceiro elemento. O prosseguimento da troca e a reprodução regular para a troca reduzem cada vez mais esse caráter contingente.” (MARX apud LUKÁCS, p. 197; grifo meu)

Marx elabora que, antigamente, as relações de troca davam-se entre comunidades, justamente entre objetos cujo Valor de Uso não eram úteis a si próprias mas eram úteis a outrem1. A proliferação da Forma-Mercadoria – e, em particular, da Forma-Dinheiro de uma mercadoria – induz o espraiamento dessas relações comerciais para dentro das comunidades, não só entre elas.

Há uma analogia com topologia (em Matemática): um espaço topológico trata-se de um conjunto , que podemos ver como o conjunto dos indivíduos (de algum país, continente, mundo, universo, o que seja), e um conjunto de “vizinhanças” de , que tratam-se de alguma granularização pertinente desse espaço . Neste nível de abstração, tudo o que importa são os indivíduos (vistos como pontos no espaço ), e as vizinhanças nas quais estes indivíduos podem habitar (pense-se em em delimitações abstratas dentro das quais estes indivíduos podem pertencer, como bairros, cidades, países, o que for pertinente à análise).

Podemos pensar nas relações de troca como ocorrendo somente entre conjuntos abertos distintos, nunca em seu interior – sejam os conjuntos abertos comunidades diferentes, passíveis de trocarem objetos entre si. O avanço do capitalismo induz com que a topologia subjacente torne-se mais “fina”, a fim de que os conjuntos abertos tornem-se cada vez “menores”, até o ponto em que todos os pontos deste espaço – ou seja, todos os próprios indivíduos – agem como se fossem “comunidades”2; dessa forma, todo indivíduo é, no capitalismo, um “indivíduo-comunidade”, e é passível de engajar em relações de troca com quaisquer outros indivíduos-comunidades.

Note-se que aqui, como em Lukács, salta aos olhos a arbitrariedade da analogia: no primeiro caso, há uma relação entre abertos (personificada pelo comerciante intermediário entre comunidades “longínquas”), e, no segundo caso, não há intermediário, as relações são tão próximas que elas já se dão diretamente entre os indivíduos-comunidades. Este é o fim último da Mercadoria: universalizar-se não só nas relações de troca, mas também nas relações sociais como um todo.


Referências

  • Lukács, G. “A reificação e a consciência do proletariado”. In: História e Consciência de Classe. Martins Fontes, 2003.
  • FOSTER, John Bellamy; CLARK, Brett. Ecological imperialism: The curse of capitalism. Socialist register, v. 40, 2004.

Footnotes

  1. Não eram necessariamente mercadorias, pois não necessariamente eram objetos produzidos com o objetivo inicial de serem trocados. Um exemplo desse “o lixo de uns é o luxo de outros” é o uso do guano peruano nas plantations inglesas no século XIX (embora entre num contexto imperialista etc etc).

  2. Esta é a chamada “topologia discreta”, em que todos os pontos (ou melhor, todos os conjuntos individuais/“singleton sets) são também conjuntos abertos.