up:: 011a MOC Capital I

“Toda coisa útil, como o ferro, papel etc., deve ser considerada sob um duplo ponto de vista: o da qualidade e o da quantidade. Cada uma dessas coisas é um conjunto de muitas propriedades e pode, por isso, ser útil sob diversos aspectos. Descobrir esses diversos aspectos e, portanto, as múltiplas formas de uso das coisas é um ato histórico. E o mesmo pode ser dito do ato de encontrar as medidas sociais para a quantidade das coisas úteis. A diversidade das medidas das mercadorias resulta, em parte, da natureza diversa dos objetos a serem medidos e, em parte, da convenção.” (MARX, p. 113-4)

Ou seja, Descobrir valores de uso de algum objeto é um ato histórico, tanto em sua qualidade — ou seja, suas potências — quanto na quantidade que permite que sejam socialmente úteis.1

“A utilidade de uma coisa faz dela um valor de uso. Mas essa utilidade não flutua no ar. Condicionada pelas propriedades do corpo da mercadoria, ela não existe sem esse corpo. Por isso, o próprio corpo-mercadoria [Warenkörper], como ferro, trigo, diamante etc., é um valor de uso ou um bem. Esse seu caráter não depende do fato de a apropriação de suas qualidades úteis custar muito ou pouco trabalho aos homens.” (p. 114)

Ou seja, o caráter natural das coisas possui momento ontológico sobre seu caráter útil: ele “não existe sem esse corpo” natural. Até mesmo valores de uso “imateriais”, como serviços, dependem de suportes materiais para que sejam usufruídos!!2

“O valor de uso se efetiva apenas no uso ou no consumo. Os valores de uso formam o conteúdo material [stofflichen Inhalt] da riqueza, qualquer que seja a forma social desta. Na forma de sociedade que iremos analisar, eles constituem, ao mesmo tempo, os suportes materiais [stofflichen Träger] do valor de troca.” (Ibid.)

Ou seja, os valores de uso são os suportes do Valor, não seus corpos-mercadoria!! Não é a materialidade em que o valor de uso está “apoiado sobre” que constitui o “suporte material” do valor, e sim o próprio valor de uso, a própria utilidade. Dessa forma, ambos são algo puramente social!

“Questionar a existência do valor só porque a sua forma é incapaz de expressá-lo adequadamente eqüivale a questionar a existência de fenômenos só porque não conseguimos enxergá-los, ou seja, questionar a existência da essência por causa das limitações explicativas da aparência.” (CARCANHOLO, 1998, p. 21)


Referências

  • CARCANHOLO, Marcelo Dias. A importância da categoria valor de uso na teoria de Marx. Pesquisa & Debate Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política, v. 9, n. 2 (14), 1998.
  • MARX, Karl. O Capital. Livro 1: O processo de produção do capital. Boitempo Editorial, 2013.
  • MIRANDA, Gutemberg. A origem social do valor: valor-de-uso e valor-de-troca numa perspectiva dialética. PRIMORDIUM, p. 235, 2021.

Footnotes

  1. Uma meia só é inútil para a função de cobrir dois pés!

  2. A Internet, afinal, precisa de ondas eletromagnéticas para chegar em nossas casas, não obstante elas serem invisíveis (neste espectro)!