Estratégia e Partido, Daniel Bensaid

Sobre a “tomada do poder"

"Mas, o que quer dizer “tomar o poder”? Não significa apoderar-se de uma ferramenta. Não significa alcançar posições. Não significa ocupar os aparatos do Estado.
Tomar o poder significa: transformar as relações de poder e as relações de propriedade. Significa fazer com que o poder seja cada vez menos o de uns sobre os outros para que seja, cada vez mais, uma ação coletiva e compartilhada.”

Para a tomada do poder, das mãos de poucos para as mãos da massa de trabalhadores, se faz necessário que se mudem as relações de propriedade, de forma que deixe de ser privada: a mudança da propriedade privada dos meios de produção, dos meios de informação, dos saberes (e.g. patentes) e dos espaços (e.g. parques, ruas).

Porém, antes da tomada de poder efetiva, faz-se necessário uma conscientização do proletariado, a fim de que seja uma ação consciente (conscious), no sentido de que não se deixe iludir pelas promessas reformistas da burguesia e da esquerda da ordem. E também porque a tomada de poder por uma minoria, invés de uma maioria, não é uma revolução: é um putsch!

Duas hipóteses estratégicas e não um modelo

”Em primeiro lugar, nos perguntam se por acaso temos um modelo de sociedade. Não temos um modelo de sociedade. Não se pode dizer ao mesmo tempo que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores e pretender ter na bagagem os planos com as dimensões da cidade futura etc.”

Justamente porque a emancipação será dos trabalhadores, sendo construída concretamente ao longo do tempo, não se pode dizer de antemão que as soluções serão tais e tais; pode-se inferir quais são as necessidades atuais da população, mas não como a sociedade futura ideal deveria ser (somente podem-se entrever algumas tendências, como democracia direta, etc.).

”Evidentemente, se não tivermos o critério para determinar qual objetivo queremos alcançar e se não tivermos ao menos, não a resposta definitiva, mas uma ideia sobre a maneira de avançar, então iremos ser sacudidos pela menor mudança na situação tática, pela menor decepção eleitoral, por qualquer derrota etc. Para construir de maneira duradoura, é necessário ter uma ideia precisa dos objetivos, das estratégias e das táticas.”

A questão do partido

”Tentar imaginar uma estratégia sem partido, é como um militar que tem em suas mãos as cartas do estado maior e os planos de guerra, mas sem ter tropas nem exército. Só há estratégia realmente se há, ao mesmo tempo, a força que pode levá-la a cabo, que a encarna, que a traduz na prática do dia a dia etc.”

Segundo Lênin, a ideia do partido não é a de ser um órgão meramente educador; antes, deve ser um orgão estratégico:

“não deve se limitar a acompanhar e esclarecer a experiência das massas,
mas deve tomar iniciativas, propor objetivos de luta, lançar consignas que correspondam a uma determinada situação e, num momento dado, ser capaz de orientar a ação.”

Deseja-se também um partido pluralista e democrático; que permita a divergência de ideias a fim de uma convergência/síntese no debate.

Sobre o surgimento da burocracia

”A burocracia não é produzida pelo partido ou, como alguns dizem hoje, pela ‘forma partido’, mas pela divisão social do trabalho, pela desigualdade. (…) As raízes da burocracia estão na divisão do trabalho entre trabalho intelectual e manual, na desigualdade ante o tempo livre etc.
Portanto, a democracia, tanto na sociedade como em nossas organizações, é a única arma que temos contra ela.”


Referências